Darwin no Brasil

Este blog é destinado a divulgar informações e a debater questões sobre as passagens de Darwin pelo Brasil em 1832 e em 1836. Estarão disponíveis imagens, textos, material audiovisual, links etc relativos à minha vinda à América do Sul, particularmente ao Brasil.

domingo, 11 de outubro de 2009

Darwin e a onçinha

Um padre português, que ficou amigo de Darwin (possivelmente o padre Manuel Gomes Souto, primeiro pároco da Paróquia de São João Batista da Lagoa), caçou uma oncinha (Felix Yaguaroundi) e deu a Darwin de presente. Ela aparece retratada no livro Zoologia do Beagle:



Textos de Darwin:

Viagem do Beagle:


Visitei pela primeira vez a floresta em que essas planárias foram vistas na companhia de um velho padre português que me levou para caçar com ele. O esporte consistia em mandar alguns cachorros para a mata e em seguida esperar pacientemente para atirar em qualquer animal que aparecesse. (...) Nossa diversão naquele dia, além do macaco, se limitou a vários pequenos papagaios verdes e a uns poucos tucanos. Fui beneficiado, porém, em minhas relações com o padre português, que em outra ocasião me deu um belo espécime de jaguarundi.



Diário de Darwin:


18 de junho
King veio e passou o dia comigo. No dorso de cavalos, ambos partimos rumo à velha floresta. (...) Na estrada de volta, surpreendi o padre, meu velho amigo, voltando com seus cachorros da Gávea. Ele me mostrou uma magnífica onça pequena que havia conseguido abater após cinco horas de caçada.

Um pivete como ajudante de Darwin no Rio

Diário de Darwin:

11 de junho [Rio de Janeiro] - Um mulato e um garoto brasileiro me acompanharam. Este era uma criança, mas se vestia da mesma forma como descrevi o filho mais velho. Nunca vi nada igual a seu poder de percepção. Muitos dos animais mais raros nas trilhas mais obscuras eram capturados por ele. Ter encontrado alguém tão capaz nesse pequeno camarada foi para mim tão inesperado quanto teria sido se um besouro traísse sua causa e se tornasse meu assistente. Foi como nos relatos sobre o talento de observação dos indígenas: meus olhos, apesar dos anos de prática, de forma alguma estavam à altura da visão dessa criança. Seria ótimo que os brasileiros conservassem, à medida que a idade avança, os modos agradáveis e cativantes que têm na juventude.





Debret- O escravo do naturalista

Textos de Darwin sobre a escravidão no Brasil

12 de março [Salvador]


Não são exagerados os relatos sobre a extensão do tráfico de escravos, sobre a ferocidade com que esse negócio é defendido e sobre as respeitáveis (!) pessoas envolvidas. Não tenho dúvida de que o estado real da maior parte da população escrava é muito mais feliz do que alguém poderia estar disposto a acreditar. O interesse e quaisquer bons sentimentos que o proprietário possa ter tenderiam a isso. Mas é uma completa mentira (como o capitão Paget bem provou) que nenhum escravo deseja retornar a seu país, mesmo os mais bem tratados. “Se eu pudesse ver meu pai e minhas duas irmãs pelo menos mais uma vez, ficaria feliz. Nunca os esquecerei.” Esta era a impressão de uma dessas pessoas que os selvagens polidos na Inglaterra mal classificam como seus irmãos, mesmo aos olhos de Deus. Em relação a essa questão, nunca mais terei escrúpulos de desacreditar completamente de pessoas cegas e obstinadamente preconceituosas a quem eu daria crédito em outros pontos.”



8 de abril [Itaocaia]

Por fim, alguns soldados foram enviados e os prenderam todos, com exceção de uma velha que, a ser capturada de novo, preferiu se espatifar em pedaços e jogou-se bem do topo da montanha. Fosse ela uma matrona romana e isso seria chamado de patriotismo nobre; como se trata de uma negra, foi chamado de obstinação brutal!



15 de abril [Fazenda Sossego]

Durante a briga do sr. Lennon com seu agente, ele ameaçou vender em um leilão público uma criança mulata ilegítima a quem o sr. Cowper é muito apegado. Além disso, ele quase pôs em prática a idéia de tirar todas as mulheres e crianças de seus maridos e vendê-los separadamente no mercado no Rio. Será possível imaginar dois exemplos mais horríveis e escandalosos? Apesar disso, garanto que o sr. Lennon está acima da média dos homens comuns em bondade e bons sentimentos. Que estranho e inexplicável é o efeito do hábito e do interesse! Diante de fatos como este, como são fracos os argumentos daqueles que defendem que a escravidão é um mal tolerável!




Augustus Earle - Escravos no Rio de Janeiro





3 de julho [Rio de Janeiro]

O estado da enorme população de escravos deve interessar a qualquer um que venha ao Brasil. Passando ao longo das ruas, é curioso observar o grande número de tribos que podem ser identificadas pelas expressões variadas e pelos diferentes ornamentos talhados na pele. Daí resulta a segurança do país: os escravos precisam se comunicar entre si em português e, por isso, não são unidos. Não consigo deixar de acreditar que, no fim, eles acabarão se tornando os governantes. Acredito nisso por conta de seu contingente e de seu belo porte atlético (em especial contraste com o dos brasileiros), que prova que eles estão em um clima apropriado, e também por ver claramente que seu intelecto tem sido muito subestimado. Eles são trabalhadores eficientes em todas as tarefas necessárias.


Se aumentar o número de negros livres (como deveria ser) e descontentes com a sua desigualdade com os homens brancos, o tempo da libertação geral não estará muito distante.


Acredito que os escravos são mais felizes do que eles próprios poderiam esperar ou do que as pessoas na Inglaterra acreditam que sejam. Temo, no entanto, que haja muitas e terríveis exceções. O aspecto principal de seu caráter parece ser a vivacidade e a alegria, a boa índole e o “coração corajoso” associado a uma boa dose de obstinação. Espero que venha o dia em que eles terão seus direitos assegurados e se esquecerão de vingar esta injustiça.


Augustus Earle - Capoeira

Darwin e o Rio de Janeiro


Desenho da Praça XV no livro sobre a viagem do Beagle

Pelas informações obtidas no livro de Darwin sobre a viagem do Beagle, no seu diário e nos seus cadernos de anotação, podemos resumir assim suas principais atividades no Rio de Janeiro:

1. Contato com a natureza tropical

2. Discussões e relatos sobre a escravidão

3. Excursão ao Norte Fluminense

4. Caçadas [Fazenda dos Macacos, Gávea] e excursões naturalistas pelas praias e matas do Rio.

5. Principais lugares visitados: Centro, Botafogo, Flamengo, Praia Vermelha, Santa Teresa, Corcovado, Igreja da Penha, Palácio de São Cristóvão,Lagoa, Ipanema, Leblon, Jardim Botânico, Horto, ...

6. Fez contatos com estrangeiros, especialmente britânicos, e com habitantes da cidade

7. Participou em exercícios do Beagle

8. Teve a ajuda de escravos, guias e de um menino carioca em suas atividades de caça e de coleta de insetos pelas matas que rodeiam o Rio de Janeiro.

9. Coletou e analisou o comportamento de peixes, morcegos, borboletas, planárias, aranhas, besouros e outros insetos

Conteúdo do capítulo II de seu livro sobre a viagem do Beagle

Rio de Janeiro — Excursão para o norte de Cabo Frio — Grande evaporação — Escravidão — Enseada de Botafogo — Planárias terrestres — Nuvens no Corcovado — Chuva forte — Rã musical — Vaga-lume e suas larvas — Besouro, poder do salto — Névoa azul — Barulho da borboleta — Entomologia — Formigas — Aranha que mata vespas — Aranha parasita — Artifícios da aranha Epeira — Aranha gregária — Aranha com teia imperfeita.




Praia de Botafogo - 1832 - Conrad Martens

Música no Brasil no período de Darwin

A música brasileira em meados do século XIX, período em Darwin esteve no Brasil fazendo suas pesquisas, estava começando a ganhar uma identidade própria. É provavel que Darwin tenha conhecido alguma coisa por aqui, dos maxixes, modinhas e lundus e tenha presenciado algum momento musical próprio das terras brasileiras. Como esse, abaixo, onde se toca e se dança lundu. Ele relata que ouviu cânticos entoados pelos escravos nas ruas de Salvador e na Fazenda Sossego. Foi também a uma apresentação de piano de obras de Mozart, no Rio de Janeiro, possivelmente no Teatro João Caetano, mas não apreciou o espetáculo.




gravura  A dança do Lundu - Rugendas

A música brasileira era muito influenciada pelos batuques dos negros escravos. A música, nos rituais escravos, era praticamente obrigatória. Nessa cena retratada pelo artista J.M. Rugendas, vemos uma típica dança praticada pelos negros chamada fandango.





Outro ritual praticado também pelos negros, onde a música estava presente, era a capoeira, uma luta de defesa pessoal.



Jogar capüera ou dance de la guerre

RUGENDAS, J.M. Voyage pittoresque et historique dans le Brasil. Paris: Engelmann et Cie, Paris, 1834.

Darwin relata que ouviu cânticos entoados pelos escravos nas ruas de Salvador e na Fazenda Sossego. Foi também a uma apresentação de piano de obras de Mozart, no Rio de Janeiro, possivelmente no Teatro João Caetano, mas não apreciou o espetáculo.

Textos de Darwin em seu diário que tratam das músicas que ouviu no Brasil:

2 e 3 de março [Em Salvador]

“Todo o trabalho é feito pelos negros, reunidos em grande número em torno dos armazéns dos comerciantes. As discussões surgidas sobre o valor do pagamento são muito animadas. Durante todo o tempo, os negros usam muita gesticulação e clamor e, ao cambalear sob seu fardo pesado, marcam o compasso e se animam com uma canção tosca.”

13 de abril [Na Fazenda Sossego, Vale do Rio Macaé]
“Uma manhã saí para caminhar uma hora antes do nascer do sol para admirar o silêncio solene da paisagem. Afinal, o silêncio foi quebrado pelo cântico matinal, entoado bem alto por todos os negros — seu dia de trabalho geralmente começava dessa forma.”

14 de junho [No Rio de Janeiro]

"Jantei com o sr. Aston e com um grupo muito festivo e agradável. À noite, fui com o sr. Scott (o adido) ouvir um afamado pianista. Ele disse que as aberturas de Mozart eram fáceis demais. Suponho que fossem tão fáceis quanto era difícil, para mim, gostar da música que ele tocou."


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sábado, 10 de outubro de 2009

Caminos de Darwin no Uruguai



Com a presença do tataraneto de Darwin, o ambientalista Randal Keynes, foram inauguradas no Uruguai, em maio de 2009, duas placas comemorativas da passagem do famoso naturalista britânico pelo país em 1832/1833.

Em Montevidéu, a bela placa feita de azulejos está colocada em um local histórico do porto da cidade, diante de Las Bóvedas, Rambla. Ela foi inaugurada com a presença da Ministra de Educação e Cultura daquele país e dos participantes da XI Reunião da Rede de Popularização da C&T na América Latina e Caribe (RedPOP).


Em Maldonado, região na qual Darwin permaneceu por várias semanas em 1833, a placa foi colocada na região do antigo porto, ao lado do Centro de Informações do município. Duas outras placas serão colocadas em Colonia del Sacramento e Soriano. O projeto “Caminos de Darwin no Uruguai” está sendo coordenado pela Associación Civil CienciaViva. A colocação das placas tem o patrocínio da Petrobrás, das Intendências das cidades e da Agencia Nacional de Investigación e Innovación (ANII). O projeto tem também o apoio do Ministério da Ciência e Tecnologia do Brasil.






Placa dos Caminos de Darwin em Maldonado



Em Maldonado, há um restaurante (Evolution) construído no local da antiga pensão na qual Darwin residiu. Uma parede da residência original ainda existe e, ao lado dela, foi construída uma sala em homenagem a Darwin.

Na localidade vizinha de Pan de Azucar, existe um monumento ao naturalista, construído pela comunidade local e colocado no lugar em que havia a estância de Sebastian Pimienta na qual Darwin se hospedou. No dia da inauguração da placa de Maldonado se encontraram ali, em clima de emoção, o tataraneto de Darwin e o tataraneto de Sebastian Pimienta (Juan Pimienta).



A passagem de Darwin por esta região foi muito produtiva, como ele mesmo revelou em seu diário: “[os últimos dias] eu os empreguei para preparar e escrever as notas sobre todos meus tesouros de Maldonado”. Várias de suas observações feitas no Uruguai, os materiais recolhidos e a coleção de pássaros ali reunida foram importantes no desenvolvimento posterior de suas idéias sobre a evolução.

Darwin na Bahia

Projeto Darwin na Bahia



A Universidade Federal da Bahia (Programa de Pós-Graduação em Ensino, Filosofia e História das Ciências), a Secretaria de Ciência, Tecnologia, e Inovação do Estado da Bahia e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado da Bahia (FAPESB), criaram este projeto para divulgar informações sobre Darwin, suas passagens pelo Brasil e, em particular, pela Bahia. Com ele, se pretende analisar também as implicações de tal passagem para a construção de suas idéias sobre a evolução dos seres vivos, além de discutir a história e a situação atual do pensamento evolutivo e muito mais, numa série de eventos comemorativos, nos anos de 2008 e 2009.


Imagem de Salvador que consta no livro de Darwin sobre a viagem do Beagle, baseado em desenho de Augustus Earle.


Charles Darwin foi um dos pensadores que mais influenciou a visão do ser humano sobre si mesmo e seu lugar na natureza. Sua teoria da evolução biológica estabeleceu as bases do pensamento biológico até os dias de hoje. Nos anos de 1832 e 1836, quando em expedição ao redor do mundo no navio inglês Beagle, Darwin aportou duas vezes na Bahia. Os eventos comemorativos que estão sendo organizados na Bahia visam resgatar a passagem desse importante naturalista por nossas terras e celebrar suas grandes contribuições.




Cemitério dos Ingleses em Salvador, local em que estão enterrados dois dos companheiros de Darwin no Beagle. Eles foram infectados em um expedição de caça no fundo da Baía de Guanabara (subindo o Rio Macacu), em abril de 1832.





Imagem de meados do século XIX da atual Praça Castro Alves No edifício à direita, ficava o Hotel do Universo no qual Darwin dormiu uma noite quando estava em Salvador. Posteriormente o prédio abrigou o jornal Mercúrio, o primeiro periódico da cidade. O prédio maior era o Teatro São João.





Para informações sobre atividades e eventos comemorativos dos anos Darwin (2008-2009) no Estado da Bahia veja o blog e o site:


http://darwinnabahia.blogspot.com/


http://www.darwinnabahia.ba.gov.br/